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prosa com poeta: Ricardo Pozzo

poeta, fotógrafo e músico: o argentino brasileiro que anda pelas frias ruas de Curitiba carrega na metáfora de seus versos o peso da sarjeta. Pozzo, ao meu ver, um dos grandes poetas de hoje pegou o gosto pela literatura através da clássica ficção científica.

(foto: Decio Romano)


Vitor: como você lida com a paixão?

Pozzo: Sofro.


Vitor: é uma bela maneira de lidar. perdemos Marcelo de Angelis esses dias. como você lida com a morte?

Pozzo: Mas que pergunta, dom Vitor! É parte da vida, não? Eu perco pessoas desde os 7 anos [minha avó], aos 12 [meu pai]. E recentemente, desde a minha mãe, tenho perdido muitos amigos. O ruim é a falta que as pessoas fazem. Entre eu saber que ele [De Angelis] tava doente e ele ter falecido foram 4 semanas, mais ou menos. Aí, conversando com um amigo [Marcos Pamplona] em comum, que inclusive tava vestindo nosso amigo falecido para o velório, falávamos dos momentos em que rimos ou trocamos uma ideia juntos e ele disse: são desses sopros que é feita a vida. Eu, dom Vitor, se estiver quites com a vida, aceitarei a morte de bom grado. Não sem tristeza, porque boa ou ruim, a vida é uma experiência e tanto.


Vitor: qual a parte mais importante da cidade?

Pozzo: A sarjeta. Na cidade a parte mais importante é o coração das pessoas, dom Vitor, que quase sempre está na sarjeta.


Vitor: você já me enviou algumas músicas que você compôs. você é poeta, mas no seu lance com a música não há letras. por que?

Pozzo: Boa pergunta! Talvez porque eu componha poemas a partir duma estrutura sonora das palavras que se bastam em si igual a estrutura dos acordes na música. Quer dizer, poesia também é música, mas dum outro tipo.


Vitor: seus poemas parecem nascer das ruas. o Leminski falava que a parte mais importante da cidade é a rua. eu digo num poema que é a vassoura varrendo a calçada. você disse a sarjeta ou os corações das pessoas que quase sempre estão na sarjeta. no silêncio dos quartos podemos ouvir os barulhos das ruas. no silêncio das ruas o que se escuta?

Pozzo: Ouço uma civilização que exige o sangue dos humanos pra subsistir. Que modula o caráter dos duplos Sapiens de acordo com um moralismo dúbio. Pense, qual o primeiro efeito do fruto da Árvore da Ciência do Bem e do Mal? Foi a vergonha de suas vergonhas. Quando Adão e Eva já não eram mais puros, foi necessária a moral. Mas não é da moral que precisamos e sim da ética. Uma ética da espécie humana. Para que milhões de vidas deixem de ser sacrificadas para a manutenção da máquina civilizatória. E que o humano possa então usufruir dessa dádiva única que é. Vida.


Vitor: você me disse que está revertido ao islã. quão íntima é sua relação com Deus?

Pozzo: O Real é o Todo que existe. Um dos nomes secretos de D us é esse. O Real absoluto. Então, buscar o Real por trás das ilusões da realidade é minha ambição em relação à D us.


Vitor: quando começarem a tributar o sol, capitalizarem a estrela maior, em breve a estrela maior extinguirá seu fogo e o sistema solar ficará sem sol. pois como todos recursos explorados a extinção é algo provável. qual a entropia da vida?

Pozzo: Vejas tu o quanto convergem as dobras temporais... Dizem que o Tempo é um dos desafios mais profícuos da Física. Por um causo tô lendo este livro, dos que são distribuídos espontaneamente, on line: ( file:///Users/vitormiranda/Downloads/edmond-hamilton-a-cidade-do-fim-do-mundo.pdf ). Particularmente gosto da clássica ficção científica, foi por onde me incluí no mundo da literatura. E este livro despretensioso sugere um mote extraordinário, que ele revela nas primeiras páginas e que se relaciona com o segundo trecho desta vossa proposição. Mas recomendo, se tu quiser ler a respeito de teorias fabulosas acerca do Tempo, O Fim da Eternidade, do Isaac Asimov.

Vitor: legal. essa pergunta tinha a ver com "a última pergunta" do Isaac Asimov. pode ser a última da entrevista.

Pozzo: Tu veja só... nem me espertei. Mas te respondendo, a entropia é o que ela é. E escapar dessa entropia, ou retardá-la é ambição da individualidade humana. Igual a Alexandre, que realizou a profecia de Aquiles e está vivo no coração do anjo [igual diz Walter Benjamin, eu acho] da História. Alexandre, o Macedônio, viveu uns 36 anos mas adentrou na eternidade da História humana. Escapou da entropia, até agora...


Alvéolos de petit pavê

Um drone observa-me por entre alvéolos de petit pavê na cidade tipo exportação feita pra ninguém

E meu irmão, que encontra-se jogado para fora do espetáculo saca de vísceras instituídas em álcool,

lamenta que a vida é rinha sem saída; e a infância invisível,

tal qual o mendigo, por entre alvéolos de petit pavê.

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